O jogo do poder no Brasil

Miguel Arraes é uma das poucas lendas da política brasileira. Ao lado de Vargas, Brizola, Prestes e poucos outros, ele encarna ao mesmo tempo um pensamento, uma prática e uma imagem. No caso de Arraes, ainda mais pelos textos que deixou escritos, como os que compõem este conjunto.Ao ler cada um destes curtos textos, o leitor percebe a dimensão forte do pensamento, a convicção extrema do compromisso, a luta do líder.

Em “O jogo do poder no Brasil”, Arraes mostra que existem a política dos jogos de cena e a política das transformações sociais; e como no Brasil pratica-se apenas a primeira, jogando-se para não se mudar. Apesar de escritos há mais de 20 anos, os textos continuam atuais, porque se o Brasil mudou tanto na política, a Política continua a mesma. Desde que Arraes escreveu sua visão, o Brasil ingressou na democracia, estancou a inflação, colocou crianças na escola, distribuiu renda às camadas pobres, elegeu um operário para Presidente, mas o poder não mudou. O jogo continua o mesmo.

O livro de Arraes é reeditado em tempos de eleição, a sexta depois da redemocratização. Se os candidatos e candidatas o lessem, perceberiam que, menos do que disputar o Poder, eles apenas jogam política, como um jogo de salão, que termina no dia da eleição, não como uma guerra de ideias para o futuro da Nação. A observação ao mesmo tempo do debate eleitoral e do livro mostra como ainda vale, um quarto de século depois, a visão de Arraes. A abertura de “O jogo do poder no Brasil” já mostra como Arraes percebia o vazio de hoje: “O impasse atinge todos os planos: É inútil separá-los, na esperança de que as coisas melhor se resolveriam cuidando de cada plano a seu tempo.”

Os discursos dos marqueteiros têm a forma de mosaicos, sem um todo; têm o tempo do presente, sem o futuro; cuidam do esforço abstrato de cada setor, sem considerar a Nação. As saídas são parciais e as comemorações aleijadas: mais bolsas-família e não menos gente precisando delas; mais crianças matriculadas e não mais jovens terminando o ensino médio com qualidade; mais crescimento e não mais bem-estar; mais carros na rua e não transportes mais eficientes; uma pequena renda adicional para os pobres e não melhor educação para todos, consciência, cultura, participação.

O jogo do poder acontece somente para viabilizar pequenos ajustes, e não para fazer a revolução. Quem olha ao redor sabe que Arraes faz falta, quem lê seus textos tanto tempo depois sabe que faz falta ler o que ele escreveu, recordar sua imagem e cultivar sua lembrança. Felizmente, isso é possível com esta nova edição de “O jogo do poder no Brasil”.

Cristovam Buarque Brasília, 17 de agosto de 2010

Gênero: Ensaio
Dimensão: 14 x 21 cm
ISBN: 978-85-60160-61-7
Número de páginas: 112
Preço: R$ 25,00